Tournê de Pregação na Índia/2003
Purushatraya Swami

Vraja-mandala Parikrama

Mostraremos nessa série, algumas cenas do décimo sétimo Vraja-mandala Parikrama da missão de Srila Prabhupada, ISKCON. O parikrama dura um mês completo. Estive somente três dias caminhando com os devotos pelas terras de Vraja, mas, em anos anteriores, tive a oportunidade de participar, em três ocasiões, do parikrama completo.

A palavra “mandala” significa “círculo”, e “parikrama” significa “caminhada ao redor de”. No caso em questão, a caminhada é ao redor da região conhecida como Vraja. Vraja é a terra sagrada, no distrito de Mathura, onde o Senhor Krishna executou Seus passatempos infantis. Vraja é um “dhama” ou morada do Senhor supremo. Krishna passou ali Seus primeiros dezesseis anos, dos cento e vinte e cinco anos em que esteve nesse mundo. Sri Caitanya Mahaprabhu revelou-nos que esses primeiros desesseis anos de Krishna nesse mundo são realmente os mais importantes, pois manifestam o mesmo bhava (sentimento ou atmosfera) de Sua morada eterna Goloka Vrindávana e a rasa ou relacionamentos amorosos com Seus devotos eternos.

Hoje em dia, poucos grupos de devotos fazem o Vraja-mandala Parikrama. Ao todo, somente uns quatro ou cinco grupos fazem o parikrama completo. O principal grupo é formado pelos próprios Vrajavasis, habitantes de Vraja. Por muitos anos, um devoto que vive na terra de Srimati Radharani, Varsana, chamado Ramesh Baba, atualmente já com idade avançada, caminha com cerca de 4000 pessoas ao redor de Vraja durante todo o mês de Kartikka. Outro grupo grande vem de Gujarat, o estado da Índia no extremo noroeste. Nesse estado a “cultura de Krishna” é também muito forte, principalmente pela influencia da sampradaya de Sri Vallabhacharya, que foi contemporâneo de Sri Caitanya Mahaprabhu. A seguir, em termos de tamanho, vem nosso grupo da ISKCON. Como já afirmei, esse é o décimo sétimo ano consecutivo que esse parikrama é realizado. Vários outros grupos fazem visitação aos principais locais de passatempos do Senhor Krishna, mas não caminham todo o percurso. Geralmente utilizam veículos para irem a esses locais e utilizam as acomodações das dharmashalas (abrigos para o pernoite dos peregrinos) e casas de hóspedes da região. Já os grupos que caminham, acampam no local em que terminou a caminhada do dia. A infra-estrutura para providenciar abrigo e alimentação para tantas pessoas numa região rural, materialmente carente, considerada “extremamente pobre” de acordo com os padrões ocidentais e atingindo locais de difícil acesso, é uma outra história aparte. Requer o conhecimento profundo da região e dos recursos que a região pode oferecer. O percurso total do parikrama é de cerca de quinhentos quilômetros e deve ser coberto em um mês de caminhada.

Esse ano, cerca de quinhentos devotos participaram do Vraja-mandala Parikrama da ISKCON. De ano para ano o numero de devotos tem aumentado. É interessante notar que a participação dos devotos indianos aumenta gradualmente. Eles vêm de todas as partes da Índia. Muitos senhores e senhoras idosas vêm de longe para fazer essa austeridade no mês de Kartikka em Vrindavana e obter assim valiosa inspiração espiritual para suas vidas. Isso, mais uma vez prova a credibilidade que a ISKCON tem conseguido na Índia. A missão de Srila Prabhupada está atingindo todas as camadas sociais na Índia. Um advogado bem sucedido de Bombaim (hoje em dia, Mumbai), Mahaprabhu Das, de sessenta e sete anos, iniciado na ISKCON, veio passar alguns dias no parikrama e me disse: “Estou realmente impressionado. Já tinha ouvido falar desse parikrama, mas não tinha uma idéia exata do que se tratava. Agora experimentei uma gotinha do néctar. Vou fazer meus planos para participar, pelo menos uma vez nessa vida, do parikrama completo.”

Alguém pode argumentar: “Esse parikrama começou depois da partida de Srila Prabhupada desse mundo. Será que Srila Prabhupada consideraria importante esse programa?”. Para responder essa pergunta, nada melhor que o pioneiro, idealizador e coordenador desse programa, S.S. Lokanatha Swami. Ele explicou que um dia, em Vrindavana, nos dias finais da permanência de Srila Prabhupada nesse mundo, Prabhupada o chamou no seu quarto e, deitado em sua cama, já numa situação terminal, e disse: “Leve-me para um parikrama em Govardhana”. Obviamente Srila Prabhupada não obteve permissão de seu médico pessoal e muito menos os devotos permitiriam que ele saísse naquelas condições, pondo sua vida em total risco. Mas esse foi talvez o último desejo de Srila Prabhupada antes de partir para a associação com Krishna. Todos os anos, a murti de Srila Prabhupada sai para o parikrama não só de Govardhana, mas de toda Vraja-mandala.

Sri Caitanya Mahaprabhu enviou os seis gosvamis, liderados por Sri Rupa e Sri Sanatana, para fixarem-se em Vraja e descobrirem os locais de passatempos de Krishna. Nessa época, Vraja estava praticamente esquecida e não manifesta. Após a partida desse mundo de cinco dos seis gosvamis, só Sri Jiva, o mais jovem, permanecia. Vieram, então, para estudar com ele, três grandes acharyas da geração seguinte de devotos: Syamananda Prabhu, Narottama Dasa Thakur e Srinivasa Acharya. Vivia, nessa época, em Vraja, um íntimo devoto do Senhor Caitanya, Raghava Pandita. Jiva Gosvami pediu que ele levasse dois estudantes, Narottama e Srinivasa, para conhecer todas as doze florestas de Vraja. Estamos, assim, seguindo os passos dos grandes acharyas Gaudiya Vaishnavas.

Na época de Krishna, existiam doze florestas por onde Ele percorria, junto com os Seus amiguinhos pastorzinhos, quando pastoreava as vacas e bezerros. Alguns demônios mandados pelo rei Khamsa foram mortos por Krishna em vários episódios ocorridos nessas florestas. Também os passatempos amorosos com Srimati Radharani e outras gopis íntimas tiveram essas florestas como cenário. As doze florestas podem ser divididas em dois grupos: a) lado ocidental do Rio Yamuna— Madhuvana, Talavana, Kumudvana, Bahulavana, Kamyavana, Khadirvana e Vrindávana; b) lado oriental do Yamuna— Bhadravana, Bhandirvana, Belvana Lohavana e Mahavana. A palavra “vana” significa “floresta”. A floresta de Vrindavana é a maior de todas e foi o palco de passatempos importantes. Hoje em dia, as florestas estão praticamente desaparecidas.

Nos três dias que estive no parikrama, visitamos os seguintes lugares sagrados:

Rama ghat Local onde Sri Balarama executou Sua dança da rasa. E também é o local, junto do Yamuna, que Sri Balarama arrastou Yamuna para junto de si, com Seu arado.

Akshaya-vat Local às margens do Yamuna em que existia uma gigantesca árvore figueira de bengala e Krishna e os pastorzinhos costumavam brincar. Katyayani Mandir— Local onde as meninas gopis adoravam Katayani Devi para obter a benção de um dia casar com Krishna. Nesse local está a árvore kadamba que Krishna pendurou as roupas das gopis que banhavam-se no rio e, para recebê-las, tiveram que sair desnudas da água.

Nanda ghat Local em que Nanda Maharaj foi raptado pelos mensageiros de Varuna, o semideus das águas e dos oceanos.

Floresta Bhadravana onde Krishna matou o demônio Vatsasura, que assumiu a forma de um bezerro e infiltrou-se no grupo de Krishna com intuito de matá-Lo.

Floresta Bhandirvana Onde Sri Balarama matou o demônio Pralambasura. Sri Jiva Gosvami conta em seu livro Gopala-campu a lila ocorrida nessa floresta do inusitado casamento de Radha e Krishna, promovido por Paurnamasi Devi. Essa lila é descrita no Adi-Varaha Purana e Garga Samhita. Outro local de importância para os devotos é Venu-kupa, poço cavado por Krishna com Sua flauta. Ali também se encontra um templo dedicado a Sridhama, o fiel pastorzinho amigo de Krishna.

Floresta Bilvana (também conhecida como Srivana)— Onde Lakshmi Devi, a consorte de Sri Narayana, o Vaikuntha-natha, executou severas austeridades para adquirir o mesmo bhava das gopis e, dessa forma, participar da dança da rasa. Mas, devido à intensa influência de aisvarya-bhava, o humor e sentimentos da opulência de Vaikuntha, Ela não conseguiu mudar o seu bhava e fracassou em Seu intento. O Senhor Caitanya explicou esse passatempo quando esteve no sul da Índia. Ele quis provar aos devotos de Lakshmi-Narayana que a adoração de Sri Sri Radha-Krishna é superior, pois o bhava de Radha-Krishna prema-bhakti não é obtido por qualquer um, até mesmo pela própria Lakshmi Devi. Pela misericórdia de Sri Sri Goura-Nitai esse bhava ficou accessível para que cultiva seriamente o processo da consciência de Krishna.

Mana-sarovara “Mana” significa “briguinhas amorosas ou ciúme” entre pessoas que se amam. Na relação amorosa primordial entre Radha e Krishna, isso ocorria às vezes. “Sarovara” significa “lago”. Aqui ocorreu também outro inusitado passatempo: o Senhor Shiva, ao banhar-se nesse lago, assumiu a forma de uma gopi e pôde assim participar da dança da rasa com Krishna. Por causa disso, Shiva é conhecido em Vrindavana como Gopishvara Mahadeva.

Um mês tocando o solo sagrado de Vraja na associação dos devotos e ao constante ouvir e cantar dos santos nomes de Krishna, completamente fora do alcance da contaminação materialista desse mundo. A alma pode então experimentar sua verdadeira natureza e o extase é total.

Lokanatha Swami dá detalhada descrição e explicações sobre a lila de Krishna ocorrida em cada lugar.

Sri Sri Nitai-Gourasundara, a murti de Srila Prabhupada, Srimati Tulasi Devi, e várias deidades e shilas pessoais são levados em procissão em volta de Vrajabhumi. Aqui vemos um dos mais interessantes e extáticos trechos do parikrama indo por quilômetros às margens do Rio Yamuna.

Em Nanda ghat, passamos para a margem oriental do Yamuna. A travessia dos quinhentos participantes do parikrama no único barco do local demorou umas duas horas. Os mais bem dispostos atravessaram a nado.

Krishna-katha, tópicos da Krishna-lila, às margens do Rio Yamuna, cedo pela manhã.

Purushatraya Swami dirige-se aos devotos do parikrama. Radha-ramana Swami traduz para o hindi (idioma predominante na Índia). Lokanatha Swami sentado à frente dos dois.

Um grupo de kirtana veio da Bengala para participar do parikrama e oferecer a todos os devotos a excelência do kirtana que os bengalis fazem com maestria. É impressionante como eles mantém caminhando e cantando durante praticamente o dia todo. E que belas melodias do maha-mantra e canções devocionais eles apresentam... Ao centro da foto vemos S.S. Bhakti-kussum Paramadaiti Maharaj que trouxe um grupo de devotos e devotas da Bengala para participar do parikrama completo. Paramadaiti Maharaj pertence à Gaudiya Math (Sri Caitanya Ashrama) e tomou diksha e sannyasi de um irmão-espiritual de Srila Prabhupada, ainda vivo, S.S. Bhakti-kumud Santa Maharaj. Vemos aí um edificante exemplo de cooperação e harmonia entre missões Gaudiya Vaishnavas irmãs.

Sri Lakshmi Devi, deidade predominante em Belvana (ou Srivana).

Hora da prasada. Excelente prasada e muita descontração e alegria em consciência de Krishna.


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